Ernest Hemingway (Illinois, EUA, 1899 – Ketchum, Idaho, 1961) foi um dos escritores emblemáticos da primeira metade do século XX. Autor de romances célebres, como “Por Quem os Sinos Dobram”, “Adeus às Armas” e “O Velho e o Mar”, além de contos e textos não-ficcionais, teve seus livros transformados em filmes, fez grande sucesso e ganhou bastante dinheiro. Turbulências eram frequentes em seu comportamento social e na intimidade. Casou-se quatro vezes e envolveu-se em muitas outras relações amorosas.
“Sra. Hemingway” de Naomi Wood (Londres, 1983) é um romance escrito com apoio em vasta pesquisa histórica e focaliza o relacionamento de Ernest Hemingway com cada uma de suas quatro esposas: Hadley Richardson, Pauline Pfeiffer, Martha Gellhorn e Mary Welsh. Mulheres de personalidades e trajetórias bastante diversas. Hadley assistiu o despontar do escritor e foi a mãe de seu primeiro filho. Pauline atravessou com ele o período mais produtivo da carreira e deu-lhe mais dois filhos. Ambas viveram com ele as transições do mundo e a intensidade inovadora incomum que marcou o período entre as duas grandes guerras mundiais na Europa. Conviveram com os casais Gertrude Stein e Alice Toklas, Scott e Zelda Fitzgerald, Gerald e Sara Murphy, entre muitas pessoas que efervesciam na sede por mudanças no funcionamento do mundo. Pauline (Fife) esteva casada com Hemingway durante o período tornado mítico pelos admiradores, quando o casal morou em Key West, na Flórida. Martha parece ter sido a mais segura, ousada e independente das quatro esposas e a única que o deixou ao invés do contrário. Mary foi aquela a quem caberia a viuvez quando ele cometeu suicídio. As duas últimas esposas eram jornalistas competentes.
Além de dar informações interessantes sobre seus personagens, Wood mostrou sensibilidade ao construir ficção tratando de temas importantes através das relações entre eles. Incluindo as triangulações amorosas. Deu relevo a questões duradouras sobre o lugar da mulher no casamento e na sociedade.
Através do romance podemos vislumbrar um perfil de Ernest Hemingway. Ele, que mesmo buscando a modernidade, não conseguiu superar as limitações do machismo também era alguém muito mais vulnerável do que se poderia ver à distância. A obsessão com o sucesso profissional e notoriedade, assim como a insegurança em relação a alcançar reconhecimento da crítica como um escritor maior parecem ter sido fatores complicadores para seu equilíbrio e maturidade afetiva. Talvez tivesse uma doença do humor que justificasse suas oscilações dramáticas, mas mais provavelmente o alcoolismo grave era a causa e consequência de tanta instabilidade emocional. O conhecimento científico da época era ainda mais restrito do que é hoje e a figura portentosa que ele tinha publicamente representaram possíveis obstáculos a tratamentos incisivos para os problemas que o afligiam. Embora alguns críticos e pessoas de sua convivência criticassem-no severamente, rebaixando seu talento, ele o teve. O que escreveu retratou o mundo em que viveu e resistiu ao tempo. As quatro companheiras também brilharam, de maneiras diferentes dele e entre si. Foram pessoas admiráveis. Naomi Wood contribui nessa obra para lembrá-las e dar-lhes o merecido papel de destaque que tiveram para o esposo e para além dele.
Leitura agradável, que informa, remete a reflexões sobre a complexidade das relações amorosas e do desafio de afirmar identidades. De quebra, faz experimentar um pouco da magia de épocas passadas recentes e que ainda resplandecem.
Título da Obra: SRA. HEMINGWAY
Autora: NAOMI WOOD
Tradutor: ROBERTO MUGGIATI
Editora: BERTRAND BRASIL
