BEIJOS DE RENÉ MAGRITTE

René Magritte (Bélgica, 1898-1967) foi um pintor surrealista. Seus quadros seduzem primeiro com um figurativismo que não fere sensibilidades convencionais, mas parecem endereçar ao observador um memorando para deslocá-lo das imagens mais fáceis de apreciar para um outro tipo de experiência. São telas que remetem aos desconcertantes absurdos sob os retratos do mundo. Muitas vezes são alinhados com as noções de inconsciente criadas pela psicanálise. Mas, certamente extrapolam esses construtos.  

O livro “Beijos de René Magritte” de Paulo Castro causa impacto. São poemas que falam de contemporaneidade imediata, mas também de elementos próprios daquilo que constitui a humanidade nos indivíduos, atemporais. Circulam por sua poesia o amor, a frustração, a Aids, a pandemia e a política. Mas estes temas prestam-se a mais do que um registro articulado pela visada do autor. Parece razoável dizer que, em termos mais comuns, os fatos “objetivos” tendem a ser enlaçados para criar uma realidade pessoal e momentânea, que pode ser compartilhada por extensas coletividades. Às vezes parece ser tudo o que há para ver e o espaço legítimo para agir. Mas, não. No falso fundo do que é historiável há um real, que não se alcança mesmo com infinitos dizeres sobre ele. Um de seus atributos é a exterioridade à razão e às interpretações, elaboradas com maior ou menor esmero. Assim, tudo o que pode ser dito é sempre insuficiente. E, por melhores que sejam as intenções, alguma coisa se deteriora rapidamente nos discursos e se transforma num tipo de mentira, evento trágico quando contradiz sua função de dizer a verdade. O livro de Paulo Castro lembra o leitor disto. É solidário com quem é humano.

Trata-se de poesia não para declamar, mas para trovejar no interior dos leitores. Não se propõe simplesmente a descrever realidades, mas sim tentar abordá-las no que podem ser para além do que parecem. O que é poético costuma deflagrar sensações, emoções e pensamentos. Há poetas inspirados pelo belo que se instala na ponta da língua e há os que tentam recuperar aquilo que se passa nos bastidores dela. Onde a crueza pode ser cantada. E os sabores cruzam a beleza e o horror. Doce e amargo são instáveis, fundem-se. O trabalho de Castro proclama uma estética. E também um ato furioso. Algo compatível com o desmanche de saberes constituídos e que, mesmo sem intenção, servem para iludir. As palavras dele rendem tributo à verdade, concebida como força que leva as pessoas aos limites de suas concepções de vida, desafiando-as, talvez para que tenham a oportunidade de refazê-las. Quem sabe afiná-las um pouco mais com quem são e com os universos onde estão instaladas.

Título da Obra: BEIJOS DE RENÉ MAGRITTE

Autor: PAULO CASTRO

Editora: BAR EDITORA

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