Em seus últimos livros Philip Roth (EUA, 1933-2018) abordou frontalmente o impacto das perdas que a vida impõe aos indivíduos. “A Humilhação” fala sobre a dimensão mais trágica de perder aquilo que se teve.
Talvez haja diferentes modos de entendimento para o que se desfaz e desaparece ou que se metamorfoseia com o passar do tempo. Os seres humanos são diversos nas maneiras de absorverem mudanças e transformarem a si mesmos diante do que os acomete para além de suas escolhas. Há os que desenvolvem alguma resiliência e adaptam-se à constante mutação da realidade. Alguns enxergam algo bom mais adiante do que perdem e desfrutam de certos ganhos. Mas isto não é para todos. Este curto romance conta a estória de um ator de grande talento que na maturidade não consegue mais representar. O vigor corporal diminui e surgem mazelas físicas. É significativa na trama a incapacitação dele para continuar atuando no teatro, o que acredita ser mais uma prova da inescapável derrocada dos que não morrem cedo. Ele não quer mais expor-se ao risco de continuar tentando e passando por vexames públicos. Ao ser convidado para interpretar um papel apropriado a sua idade e força dramática ele declina. Desiste da carreira. A esposa abandona-o quando se sente impotente para fazer com que ele saia do registro exclusivo da própria falência. Talvez o que haja de mais trágico no protagonista seja a recusa em aceitar perder sem se destruir. Não se importa em aquilatar a extensão das perdas. Anula o restante de sua existência. A importância das coisas não faz migrações de objeto na vida dele. Não consegue nem se apropriar do que produziu ao longo de décadas de sucesso profissional. É como se tudo sempre tivesse sido falso, como se suas realizações não passassem de eventos atribuíveis a um personagem fictício a ser descartado. Ele enfraquece. Inesperadamente vive uma nova relação amorosa em que presume a saída para interromper o fluxo da decadência de que sente-se vítima. O sexo e amor ganham sentidos inusitados em seu funcionamento. Contudo, ele frustra-se mais e suas expectativas escorrem por fendas irremediáveis.
Obra impactante por falar não somente dos desafios do envelhecimento, mas de incapacidades das pessoas de qualquer idade que são erroneamente depositadas e fixadas neste processo, confundidas com ele, implicando perdas bem maiores do que as inevitáveis.
Título da Obra: A HUMILHAÇÃO
Autor: PHILIP ROTH
Tradutor: PAULO HENRIQUES BRITTO
Editora: COMPANHIA DAS LETRAS

Li muito P. Roth durante uma época e faz tempo que estou com vontade de ler de novo, sua resenha colaborou. Vou ler esse aí.
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Um de meus autores favoritos. Obrigado por comentar
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