LITERATURA E DIVERSIDADE

Boas leituras, ficcionais ou não, podem transportar o leitor para mundos diferentes do seu. Promovem a suspensão dos objetos fixos de sua paisagem mental. Podem fecundar campos anteriormente confinados à monotonia do que já nem se vê, de tão repetido. O bem ler instiga olhares para exteriores insuspeitados e cria chances de inovação  nas maneiras de compreender o que já parece conhecido demais. Patrocina o encontro com o diverso. Este, brota da incongruência entre o que surge como novo e as concepções pré-formadas e já abraçadas firmemente. Com alguma sorte o diverso torna-se antídoto das automatizações cognitivas. No entanto, o que é diferente do esperado ou familiar pode ser combatido e excluído cegamente, sendo tomado como ameaça. Tal reatividade parece ser uma tendência inerente ao aparelho instintivo dos humanos, uma força que faz recuar para abrigos escuros. Ler com empenho e liberdade, evitando direcionamentos interpretativos rígidos, enriquece o intelecto e constrói inteligência. Pode abrir portas para o funcionamento ético. A oportunidade de enxergar e de se nutrir com a diversidade é essencial à sobrevivência, mesmo que não o pareça à primeira vista. Sem isso não ocorre evolução adaptativa e também transformadora, negligencia-se a essencial criatividade. É possível valorizar esse tipo de asserção mesmo quando não se toma o pensamento darwiniano como modelo. A literatura de qualidade, o que implica tanto o conteúdo do que se lê quanto a forma de o tratar, pode não ser aprazível num primeiro contato. Frequentemente é um desafio para o intelecto (o que também assusta). O que se percebe como “estranho“ no texto pode ser confundido com hermetismo ou como pretensão fútil. É preciso ter cuidado com isso, pode ser um modo de preconceito. Uma comunicação que demande complexidade de interpretação e ampliação dos saberes pode ser rechaçada muito rapidamente. Ela reduz o conforto promovido pela impressão de que já se sabe o suficiente e acaba minando a ilusão de que é possível a conversão da “verdade” em bem durável, de propriedade individual ou coletiva.  Geralmente é nesses campos literários resistentes ao óbvio e às banalidades que são feitas grandes colheitas. O diverso está quase sempre fora do que o indivíduo reconhece sem esforço, assim como a incapturável “verdade”. Ainda que este indivíduo cumpra os deveres necessários para ser verdadeiro no que pensa e em como age. O diverso costuma expandir os recursos do leitor,  apetrecha-lo com coragem e congêneres. Depois de um certo aprendizado para navegar nos bons livros e de empreenderem-se viagens para a dessemelhança surgem novas áreas de sensibilidade que propiciam prazer e permitem saborear o que não é imanente ao viajante. É provável que as navegações da vida cotidiana tornem-se também mais frutuosas.

Abaixo foto da biblioteca da Universidade de Bolonha:

bolonha

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4 comentários

  1. Luís, que texto excelente. É um louvor lindo à leitura e a suas implicações, às suas consequências. Muito obrigada e um beijo.

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  2. essa estante do Justo é imperdivel.Sao resenhas e comentarios ricamente elaborados com clareza e simplicidade sobre temas variados.

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