O HOMEM SEM DOENÇA

As mudanças do mundo têm sido tantas e tão rápidas que o ser humano, seu produtor, parece estar atônito. Cada vez mais submetido a determinantes que não pode compreender com clareza, percebe a realidade como incontrolável. As dificuldades e impossibilidades são muito mais da ordem da complexidade do que da complicação estrutural ou conjuntural. O que é complicado num determinado sistema pode ser desmembrado em componentes mais simples, analisado e suficientemente entendido. A complexidade se dá pelo surgimento de elementos totalmente novos nesse sistema, tanto pela interferência do que lhe é externo como pela interação dos elementos pré-existentes, produzindo componentes novos e que passam a fazer parte e influenciar o funcionamento do todo. Contradições, irracionalidade e violência sempre foram possibilidades no comportamento dos indivíduos e grupos sociais, mas vêm ganhando roupagens e instrumentos mais ameaçadores. Na segunda metade do século XX e início do XXI o desenvolvimento das tecnologias ultrapassou a capacidade de previsão das consequências disso. Pensemos nos dispositivos de comunicação. Manifestações do potencial destrutivo do homem também tiveram sua dimensão trágica renovada, como diversos atentados terroristas têm demonstrado. Guerras são ainda mais assustadoras do que no passado. É difícil desfrutar da sensação de segurança e paz.

O escritor holandês Arnon Grunberg (Amsterdã, 1971) vem falando deste inquietante mundo novo, após as expressões mais recentes do terror, como o “11 de setembro”. Sem a preocupação de explicar causas ou articular justificativas, ele ocupa-se do impacto destes eventos sobre a vida dos indivíduos. Mostra um modo de pensar pouco palatável no universo do “politicamente correto” sobre o modo de interpretar as intenções e ações humanas diante do que se traduz em perigo na atualidade. Em “O Homem Sem Doença” Grunberg trata das posturas temerárias em oposição às temerosas. Talvez fosse mais apropriado falar de (im)prudência nas interações de culturas tão diversas e valores tão conflitantes quanto os que se entrechocam com a globalização. Sua crítica cheia de ironia dirige-se ao europeu que, no modo de ver do escritor, insiste em desconsiderar a maneira como é visto por grande parte dos povos orientais, especialmente árabes. Diferentemente dos norte-americanos os europeus têm idealizado em excesso sua versão de civilização ocidental, especialmente quanto à possibilidade dela ser suficientemente inclusiva, tolerante e aberta ao multiculturalismo, supondo criar uma espécie de imunidade à barbárie. O escritor sugere que a pretensão à neutralidade é insustentável, quase sempre uma fantasia evidenciando um traço de vulnerabilidade potencialmente letal. A concepção de civilidade enquanto força poderosa o suficiente para livrar pessoas das “doenças” trazidas pelo medo ou pela consciência da agressividade e destrutividade inter-humanas estaria condenada à falência. Para o autor, encarar o mundo como apaziguável através do que poderia ser tomado como permissividade seria incompatível com a sobrevivência.

Assim, em meio à profusão de formatos do Mal que grassam pelo planeta não se poderia viver impunemente sem doença. Ideia bastante perturbadora.

Título da Obra: O HOMEM SEM DOENÇA

Autor: ARNON GRUNBERG

Tadutora: MARIÂNGELA GUIMARÃES

Editora: RÁDIO LONDRES

grunberg

 

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