O CHAPÉU DE VERMEER

Os seres humanos sempre vagaram pelo mundo. Mesmo antes de serem designados de humanos. Os motivos para migrações ou deslocamentos temporários têm variado ao longo da História. A procura de melhores condições de vida, riqueza, poder e até curiosidade levaram a grandes andanças. Na Antiguidade, povos como os Fenícios viajaram pelo Mar Mediterrâneo no intuito de comerciar e acabaram fundando cidades distantes de sua terra de origem, influenciando pessoas e contribuindo para transformar o mundo. Este é só um exemplo mais remoto. No final da Idade Média as feiras impulsionaram o renascimento de cidades que haviam minguado durante o período feudal. O comércio sempre fez com que as pessoas se movessem. Promoveu intercâmbios culturais. Destruiu e construiu muito. O século XVII foi marcado pela expansão do comércio marítimo e possivelmente pelo nascimento do que mais tarde denominou-se “globalização”. Nações tornaram-se poderosas por esta via, ganharam braços que operavam em lugares distantes de seus centros de comando. Aproximações e intercâmbios entre pessoas de formações heterogêneas, antes improváveis, tornaram-se parte das possibilidades concretas da vida. As transações comerciais lançaram as bases do multiculturalismo.  O historiador canadense Timothy Brook (Toronto, 1951), eminente sinólogo, dedicou um livro às imensas metamorfoses do planeta decorrentes das grandes navegações comerciais do século XVII. “O Chapéu de Vermeer” alude ao que está representado em alguns quadros do célebre pintor holandês Johannes Vermeer (Delft, 1632-1675) para empreender uma excursão por uma parte importante da História. Estas pinturas incluem como elementos de cena alguns produtos de remotas procedências, como um chapéu de feltro de castor, moda na Europa desse período, cuja matéria prima era trazida do Canadá. O artista também ilustrou novos hábitos dos indivíduos nessa época. Isso aparece em cenas de interiores domésticos, mostrando o alcance das remodelações do viver que estavam em curso. Vermeer demonstra bem como a arte é (também) uma forma de documentação histórica. Brook, em parte inspirado pelo pintor, abre janelas que permitem ao leitor vislumbrar esse universo. Tem destaque o papel de empresas como a Companhia das Índias (holandesa, pois existiu também a britânica), que fez os europeus entrarem em contato com a porcelana chinesa e, por outro lado, introduziu materiais e usos ocidentais na China. Japão, Filipinas, Índia e outros países do Oriente participaram em menor escala dessas trocas. A Companhia das Índias Ocidentais também é mencionada para falar do horrível tráfico humano (africanos capturados ou comprados e vendidos como escravos no continente americano). A introdução do fumo, vindo das Américas entre europeus e asiáticos também aconteceu nesse momento . O interesse pela Geografia cresceu. Os metais preciosos, como a prata e o ouro, tornaram-se ainda mais importantes para instrumentalizar transações. Diversificaram-se os modos de enriquecimento e surgiram novos atores da mobilidade social. Mudaram os valores. A imprevisibilidade e transitoriedade na evolução do mundo ganharam evidência. Certezas antigas revelaram-se crenças insustentáveis. O conhecimento evoluiu. Novas ordens criaram mais aceleradamente um mundo novo. Muita informação e prazer nesta leitura.

Título da Obra: O CHAPÉU DE VERMEER

Autor: TIMOTHY BROOK

Tradutora: MARIA BEATRIZ DE MEDINA

Editora: RECORD

chapéu

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