Descrever relações entre pessoas, assim como definir identidades, são processos que não se completam, exceto pelo uso de artifícios limitantes. Olhares diversos podem produzir interpretações muito diferentes, cambiantes, instáveis. Observações coletadas com cuidados de abrangência e inclusão possibilitam a construção de imagens mais interessantes e fidedignas. Ivan Búnin (Vorônej, Rússia, 1870 – Paris, 1953) deu relevo a estes temas na novela “O Processo do Tenente Ieláguin”. Partindo de um evento real, um crime passional, o escritor explorou a superposição de versões para marcar a precariedade das compreensões fechadas sobre humanos e suas interações. Esta obra de poucas páginas é uma ode à sensibilidade e capacidade de dizer muito, de modo econômico. A concisão precisa da narrativa contribui para uma estética. O autor mostra que tomar algo como óbvio e em seguida banal, acaba por evidenciar a dificuldade para compor significados multidimensionais e o cegamento inerente ao simplismo dos que tomam uma suposição coerente, ou mesmo um saber, como verdades. A complexidade das motivações, as singularidades, a diversidade, revelam-se na multiplicação de discursos distintos sobre o que parece ser uma mesma situação, ou pessoa. A personagem central da narrativa é emblemática no que toca à inexatidão e evanescência na tentativa de afirmação da própria identidade e naquilo que o observador é capaz de apreender sobre seu objeto de interesse. Búnin, auto exilado após a Revolução Russa de 1917, foi o primeiro russo a receber um prêmio Nobel. Vale destacar que o tradutor foi Boris Schnaiderman. Falecido aos 99 anos em 2016 Schnaiderman contribuiu muito para a boa qualidade das traduções diretas de grandes obras da literatura russa para o português.
Título da Obra: O PROCESSO DO TENENTE IELÁGUIN
Autor: IVAN BÚNIN
Tradutor: BORIS SCHNAIDERMAN
Editora: 34
Amo ler
CurtirCurtido por 1 pessoa