DISTÂNCIA DE RESGATE

Proteger as pessoas que amamos, especialmente as que dependem de nós mais diretamente, é um desejo de quase todos. No entanto, vamos descobrindo ao longo da vida que nosso poder de fazer isso é muito mais limitado do que supomos. Algumas vezes é difícil tolerar o fato de garantirmos tão pouco aos nossos próximos (também aos não tão próximos). A maternidade parece ser um dos mais vivos exemplos desse anseio e também dos sobressaltos gerados pela percepção das dificuldades em realizá-lo. Tal contraste pode ser identificável em muitas outras relações humanas e contextos. Talvez um dos importantes aprendizados que tenhamos a fazer na vida seja o de compreender que persistir nos esforços é sempre importante, mas que também é imprescindível desenvolvermos a resiliência para sobreviver do melhor modo possível aos insucessos desse empenho.

“Distância de Resgate” é uma novela que tem este mote, escrita pela argentina Samanta Schweblin (Buenos Aires, 1978). O livro foi curiosamente classificado e premiado como romance. As novelas são sempre menos extensas do que os romances. Em amplo sentido, desde o volume textual até a restrição do enredo e menor número de temas e personagens. Algo intermediário entre o conto e o romance. Como nesse caso.

Na curta narrativa de Schweblin ficamos sempre com a sensação de que há um mistério a ser revelado, necessário para dar acabamento à estória. Somos arrebatados pela premência de encontrar salvação para algo que não está claramente definido. Há tensão o tempo todo e quase uma compulsão de continuar a leitura e alcançar alguma serenidade através da conclusão dos sentidos e intenções pretendidos pela escritora. O clima de suspense é essencial para dar força ao real objetivo do texto, tornar a busca de desvendamento tão importante para o leitor quanto para os poucos personagens em cena. Para não escamotear os perigos. A obra ultrapassa largamente as alusões a situações concretas às quais pode estar ligada, como os riscos envolvendo o uso de agrotóxicos e outras agressões ao meio ambiente, a aproximação com indivíduos estranhos e temores sobre quem são ou o que podem vir a ser aqueles com quem nos relacionamos. Também mira mais do que os pavores das mães ao perceberem as ameaças que rondam suas crianças. Diz respeito a algo maior, mais vago e universal no escopo de experiências da vida. Trata do que costuma ser inerente à alma dos indivíduos que são capazes de amar e que vêm o valor de cuidar, de não negligenciar, de contribuir para o bem-estar do outro. Em que, todavia, é inevitável o peso do montante de incertezas nesses campos. Há uma espécie de dinamismo incessante, transfigurador, tanto para problemas quanto para soluções. As fantasias tornam-se elementos de grande porte nas vivências que temos quando nos damos conta de nossa fragilidade incontornável. Desvios para obter alívio podem ser impraticáveis. Os jogos criados em nossos viveres renovam-se sem parar, assim como as regras para jogá-los. Parece ser disso que autora quer tratar. Um enredo em que ela sugere a existência de um tipo de verdade nas fábulas de terror desenhadas pelo imaginário. Livro interessante de ler. Condição difícil de enfrentar.

Título da Obra: DISTÂNCIA DE RESGATE

Autora: SAMANTA SCHWEBLIN

Tradutora: IVONE BENEDETTI

Editora: RECORD

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