Na rua muito se vê. Público e privado estão ali, ou dali são mirados. Há os modos de relações sociais e pode-se anunciar o que se é. Às vezes com boas parcelas de verdade. E também vislumbram-se interiores, intimidades. Busca-se alguém na rua. Perde-se. Para ela são mandados os indesejados. A rua é caminho para a vida e para a morte. Uma das vias de trânsito da pluralidade humana. Miguel Torga (São Martinho de Anta, Portugal, 1907 – Coimbra, 1995) publicou em 1942 um livro intitulado “Rua”. Treze contos em que esta palavra e suas dimensões de sentido são referência. Com típica delicadeza, o autor não faz alarde sobre aquilo que pretende que veja quem o lê. Há respeito às múltiplas possibilidades, além da sua. Na polissemia da palavra do título são construídas pequenas estórias onde estampam-se ou presumem-se tragédias, dramas e comédias que podem traduzir a vida. Não falta a marca dos pontos finais, de dissolução das narrativas, em que revela-se o esforço do indivíduo para atestar a consistência do seu existir. O que é grande reside nas aparentes “miudezas”. Torga ocupou-se de falar de temas universais, que podem importar em diferentes culturas e tempos, sem dispensar roupagens próprias. Aqui, como em quase tudo que escreveu, usa um linguajar profundamente português. E popular. Assim, reflete a fidelidade ao que ele próprio viveu. Faz disso seu instrumento. Torna-se crível no lirismo e familiar aos leitores de outros mundos. A beleza circula livremente pelos textos e nunca é superficial. O belo, que em Torga não é antônimo de feio, brota de realidades fortes, sem artifícios. Atinge-nos. Ele faz de seus personagens mensageiros de uma visão generosa daquilo que é humano. Desperta emoções solidárias. Promove amor. Por semelhantes e dessemelhantes. No Brasil este livro foi publicado pela Nova Fronteira.
Título da Obra: RUA
Autor: MIGUEL TORGA
Editora: GRÁFICA DE COIMBRA