Kibutzim (plural de Kibutz) são comunidades tipicamente israelenses que pretendiam em suas origens a maior autonomia econômica possível, organização igualitária do trabalho e administração interna democrática. Surgiram no início do século XX (o primeiro foi fundado por Joseph Baratz em 1909 e se chamava Degania). A fundação dos Kibutzim foi um desdobramento das ondas imigratórias para a Palestina, de judeus principalmente da Rússia e suas possessões, mas também de outros países, que começaram a ser notáveis no final do século XIX e aumentaram expressivamente no início do século XX. Os kibutzim tiveram diversas funções para aqueles que pretendiam fundar um Estado que fosse pátria para o povo judeu (uma nação sem pátria até 1948, quando houve a fundação de Israel). Dentre estas funções, o desenvolvimento do trabalho agropecuário foi fundamental, tanto por razões de ordem prática como, de certo modo, ideológicas, desvinculando o perfil tradicional do judeu das atividades ligadas ao comércio e finanças. Estas comunidades também tiveram papel na ocupação de territórios, contribuindo para a demarcação de fronteiras e participando ativamente nos conflitos armados com os árabes palestinos. Os kibutzim não se orientavam diretamente por diretrizes religiosas ortodoxas, embora geralmente observassem as tradições judaicas. Sua organização, das fundações até aproximadamente a década de 60, foi muito influenciada por ideias socialistas ou talvez comunistas, embora sem seguirem Marx ou os regimes soviético e chinês. Valorizavam o trabalho conjunto, com abolição de salários e igualdade de status entre os trabalhadores, abolição da propriedade privada, redução da autonomia individual (decisões importantes deveriam ser compartilhadas em assembleias e autorizadas por elas), reorganização da família (as crianças, por exemplo, eram criadas em casas separadas de seus pais, mesmo que estes as visitassem diariamente), entre outras inovações. Um kibutz atualmente é muito diferente do que era em seus primórdios, inclusive sendo bem mais aberto e interativo com a vida econômica israelense, além de mais sensível aos acontecimentos internacionais. “Entre Amigos” de Amós Oz compõe-se de oito estórias interligadas, que se passam todas num mesmo kibutz imaginário, nos anos 50. Cada uma tem estrutura de conto, mas no conjunto aproximam-se do romance. Com a sutil profundidade que lhe é característica Óz aborda as dificuldades no manejo dos vínculos afetivos neste tipo de convivência. Amor, ódio, inveja, ressentimento, crueldade, compaixão e outros afetos que deveriam acomodar-se aos moldes ideais e compatíveis com o que se pretendia para o bom funcionamento do kibutz, escapam e vão produzindo decepções e conflitos. Ao discutir dramas individuais o autor aponta para o fato de que as sociedades, em qualquer nível, são feitas antes de tudo por indivíduos dotados de forças motrizes rebeldes à necessária racionalidade, potentes e destrutivas (às vezes cegamente). Forças insubmissas ao bom senso e solidariedade, aos projetos que são arquitetados sem lhes reconhecerem o poder. Estas características humanas são impermeáveis às idealizações e utopias. Desfazem miragens. O psicólogo Bruno Bettelheim (Austria 1903- EUA, 1990) dedicou reflexão ao comportamento das pessoas em kibutzim e observou dificuldade quanto à intensidade e duração das ligações interpessoais, atribuindo isto, em parte, à perda da propriedade privada. Não seria preciso dizer que foi muito criticado, mas não deve ser ignorado. Amós Oz não teve interesses acadêmicos quando falou sobre isto. Oz talvez possa ser chamado de humanista e deva ser visto como um intelectual que clama por justiça, um batalhador contra os fanatismos, um racionalista que não se furta ao reconhecimento dos cataclismos provocados pelas forças psíquicas que se renovam sempre, imprevisivelmente, indomáveis e perigosas nas relações entre indivíduos e um pensador notável ao driblar a ingenuidade. É forte em sua honestidade e franqueza. Nunca um pregador. Alguém ciente dos desafios que surgem quando se está entre amigos. E que sabe dizer muito bem o que pensa. Inclusive entre amigos.
Título da Obra: ENTRE AMIGOS
Autor: AMÓS OZ
Tradutor: PAULO GEIGER
Editora: COMPANHIA DAS LETRAS
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Li esse livro há algum tempo, gostei demais. Seu post acrescentou ainda mais. Obrigada, Luís.
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Eu é que te agradeço pelo comentário querida Anaelena.
Beijos
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Esse tb vai pra lista… Que só cresce!… ðððððð
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Vale a pena Malu.
Obrigado por comentar
Saudade de você
Beijos
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Suas análises sempre despertam curiosidade e vontade de conderir, que é com certeza seu objetivo, plenamente alcançado.
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Obrigado Ernani
Abraço
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