PHILIP ROTH

Philip Roth (Newark, 1933-Nova York, 2018) foi um forte. Produziu grandes obras. Significativas contribuições para os humanos que buscam crescimento e sabem que isto não acaba nunca. E que não o temem quando acontece, como Roth não o temeu. Para além de descrever o homem ocidental contemporâneo, que turbilhona o mundo que o turbilhona e tem escassa percepção do que faz, este norte americano de raízes judaicas falou sobre a complexidade do pensar, agir e viver para e sobre quem existe fora dos livros. Observou criticamente os  fundamentos daquilo que nos torna animais distintos de todos os outros e que nos são típicos, de modo mais ou menos universal. Poderiam aqui ser incluídas as formas de intolerância com o que é diverso, manifestadas como racismo, antissemitismo, iniquidades de gênero, assim como para com capacidades positivas, que podem engendrar inveja e desejo de destruição daquilo ou de quem não se é ou não se pode ter. Não deixou de fora a pusilanimidade, suas dissimulações e sua abrasividade desbastadora de hombridades, por tantos cantadas. Trouxe para a arena e deu face àquilo que entorta os mais nobres desígnios dos indivíduos, atingindo-os a partir de dentro e também de fora. Falou do homem como ator canhestro, mambembe, da peça em que tenta fazer crível o precário enredo que protagoniza. Aqui, o cômico prenuncia o trágico, quando a verdade amorfa se impõe às máscaras bem esculpidas. Minúsculas violências são mostradas como “facilidades” ao alcance de todos e instrumentos dos relacionamentos interpessoais. Sem maldade. Desnudou  sucessivas dimensões daquilo que pode ser traduzido por impotência ante o absurdo que assalta o indivíduo e faz sucumbir a razão. Apontou para a responsabilidade singular e intransferível de cada pessoa por todos os atos que pratica. Deliberados ou não. Ignorados ou não. Culpas à parte.  A adjetivação é relativamente irrelevante naquilo de que Roth trata. É tudo muito substantivo. Lamentos e piedades não brotam em seus solos. Ele lavrou o que constatou. Expôs com palavras claras, firmes, destemidas, o que pode ver. Assumiu os riscos do engano. Desafiou o engano. Seus romances definem  temas desdobráveis em múltiplas camadas que dependem do interesse reflexivo do leitor, mas não lançam mão da vagueza no que afirmam em cada nível de leitura. Há limites bem desenhados. Seus personagens são parentes dos de Sófocles e de Shakespeare. Gestados nas gemas que produziram Édipo. Hamlet e outros dessa estirpe e que revelam incessantemente mais do que parecem pretender, afirmando que não há simplicidade na vida de quem tem olhos para enxergar. Para estes personagens, nas tramas em que estão imersos, não há amarras a portos que abriguem e protejam, as referências devem ser sempre questionadas, tomadas como artifícios de utilidade circunstancial. Talvez, para parte dos que o leem, reste a sensação de que o bem viver exige talento. Muito. Meus preferidos, entre seus livros, são “A Marca Humana”, “Pastoral Americana”, “Casei-me com um Comunista”, “Animal Agonizante”, “Indignação”, “Humilhação”, “Nêmesis”, “Patrimônio”, mas há muito mais.

Philip Roth (Newark, 1933 – New York, 2018) was a force. He produced great works—significant contributions for those human beings who seek growth and who understand that such growth never truly ends. And who do not fear it when it comes, as Roth himself did not fear it.

Beyond portraying the contemporary Western man—swirled by a world that he himself swirls, with little awareness of his own motions—this American writer of Jewish roots spoke of the complexity of thinking, acting, and living for and about those who exist outside the pages of books. He critically examined the very foundations of what makes us animals distinct from all others, qualities more or less universal to our kind. Among them: intolerance of difference, manifested as racism, antisemitism, and gender inequities; but also intolerance of positive capacities that provoke envy and a desire to destroy what one cannot be or cannot possess.

He did not neglect pusillanimity—its dissimulations, its corrosive abrasiveness that wears away at manhoods so often sung. He brought into the arena, and gave a face to, what distorts the noblest designs of individuals, striking them both from within and without. He portrayed man as a clumsy, makeshift actor, fumbling through the fragile script he himself embodies. In Roth’s vision, comedy shades into tragedy, when shapeless truth breaks through carefully sculpted masks.

He revealed the small violences—those “conveniences” at everyone’s disposal—as instruments of interpersonal relations, without malice. He stripped bare successive layers of what can be called impotence before the absurd, the force that assails the individual and topples reason. He underscored the singular, intransferable responsibility each person bears for every act he or she commits—deliberate or not, acknowledged or not—guilt aside.

For Roth, adjectives mattered little; substance was everything. His ground did not yield pity or lamentation. He cultivated what he observed, and exposed it in clear, firm, fearless words. He accepted the risks of error, and challenged them. His novels present themes that unfold into multiple layers, depending on the reader’s reflective engagement, yet they never rely on vagueness. The boundaries are sharply drawn.

His characters are kin to those of Sophocles and Shakespeare—born of the same seeds that yielded Oedipus, Hamlet, and others of that lineage. They ceaselessly reveal more than they appear to intend, affirming that life is never simple for those who have eyes to see. For such characters, within the webs they inhabit, there are no moorings to safe harbors; references must always be questioned, treated as mere artifices of circumstantial utility.

Perhaps, for some who read him, there remains the sense that to live well demands talent—immense talent.

My favorites among his works include The Human Stain, American Pastoral, I Married a Communist, The Dying Animal, Indignation, The Humbling, Nemesis, and Patrimony—though there is much more.

#literatura #estantedojusto.com #philiproth

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6 comentários

  1. Estive andando em Newark, procurando pisar onde Roth pisou. Mas a cidade já não é mais uma personagem como na ficção tão contundente. Mas não tem importância: tenho certeza que vi o Sueco andando rumo á fábrica de meias.

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  2. Mais um comentário excelente. Obrigada, Luís. Fico pensando que é uma maravilha ele ter deixado uma obra tão vasta e que ainda há muito para ler do querido e enorme Roth.

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