HEGEMONIA, ÉTICA E TOTALITARISMO

É possível que as ideias e ações de cunho hegemônico existam desde que as sociedades se formaram. Hegemonias têm relação com a dominação ampla e exclusiva exercida por homens ou sistemas de pensamento sobre indivíduos e populações. Seus rudimentos parecem vir do instinto/desejo de dominação de uns homens sobre os outros. Talvez tenham raizes na evolução das espécies, na luta crua e de visão restrita pela sobrevivência. Ganharam espaço no pensamento dos humanos de maneiras cada vez mais complexas. Atravessaram a história e persistem nela com roupagens diversas. Às vezes implicam uso direto da força, noutras utiliza-se o convencimento sedutor, carregado de promessas falaciosas, submetendo grandes grupos de pessoas e tornando-as coniventes com o que é injusto e mesmo brutal.

Talvez os regimes totalitários de governo (com variações nos matizes ideológicos, mas geminados no que realmente são) constituam suas representações mais emblemáticas. O nazismo alemão, o fascismo italiano, o stalinismo soviético e o maoismo chinês são exemplos que marcaram o século XX. Similares existiram em muitos lugares anteriormente e posteriormente.

No século XlX o marxismo (como filosofia ou um projeto para o desenvolvimento das sociedades) não prescindiu da ideia de hegemonia para alcançar o sucesso revolucionário a partir da luta de classes. A valorização da hegemonia imiscuiu-se entre muitos dos que acreditaram e acreditam em caminhos que sigam esta orientação. O italiano Antonio Gramsci (1891-1937) recomendou somar à força de dominação dos indivíduos por parte do Estado (com fortalecimento máximo do poder de governantes sobre governados) ações planejadas de “direcionamento intelectual e moral” (doutrinação) destes indivíduos, criando mecanismos para fomentar sua obediência aos líderes. Neste escopo, a ideia de hegemonia sustenta-se como recurso para impedir a corrosão do poder de um grupo comandante causada por “resistências” da parte de indivíduos ou grupos que se contraponham através de críticas e demandas ou propostas alternativas. Os regimes totalitários estabelecem-se e mantêm-se através de hegemonias estabelecidas em diversas áreas, como culturais, educacionais, militares, legais, etc. Neles são suprimidas as diversidades e as capacidades individuais para o exercício de potenciais criativos e transformadores, consonantes com a complexidade da vida.

Os extremismos ideológicos são bastante parecidos neste campo, tanto no que se denomina direita quanto na esquerda, assim como os fundamentalismos religiosos.

Se tomarmos o pensamento ético como aquele que exige a revisão constante dos valores assumidos e sua modificação eventual podemos pensar que a ânsia por hegemonia é uma forma de perversão do dever humano para com a civilidade e o ideal de justiça social. É um empecilho grave à democracia. Um modo de exclusão dos governados no que concerne à governança. Talvez a Razão seja insuficiente para controlar este comportamento um tanto animal, que os homens desenvolvem para se subjugarem uns aos outros, mas nunca deve ser descartada.

Abaixo Cabeça de Medusa, mosaico encontrado na Ilha de Creta, Grécia

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