A educação das pessoas e povos pode ser compreendida e empreendida partindo-se de referenciais muito diversos. Frequentemente reconhecemos como educação o conhecimento que se adquire/transmite nas escolas, da alfabetização à habilitação profissional. Tais processos fazem parte da formação das pessoas. Todavia, formação tem sentido mais amplo e implica aquisição de um conjunto de informações e seu uso, apropriação de costumes constituintes da cultura, capacitação para o relacionamento com outros indivíduos tanto em micro quanto em macro sistemas, noções quanto ao papel que se pode ou se deve exercer no mundo em que se vive, introjeção de valores, exame frequente destes em relação a sua justeza e aplicabilidade ao contexto em que se vive e certamente mais. Falamos de uma dimensão fundamental e complexa do desenvolvimento humano. A educação é plural e mais ainda o é a formação. Muitos são os caminhos possíveis.
Tanto para a educação escolar quanto para a formação mais ampla importam muito as ideias de liberdade, responsabilidade e dever, o que se articula com questões éticas. A ideia de liberdade faz pensar que educar e receber educação não deve ser confundida ou usada como via de doutrinação ideológica ou de outros credos por parte de quem educa, mesmo que seja impossível isenta-la completamente da influência deles. Quando ocorre, especialmente se de modo deliberado, pode resultar em opressão. O processo (inevitavelmente restritivo e frequentemente condenatório) passa a ser uma forma de limitar a capacidade das pessoas na busca por crescimento e de participação consciente e criativa no mundo em que vivem. Quando se doutrina alguém também se exerce coação. Sutil ou grosseiramente. A posição do mestre confere um poder que nunca deve ser exercido de modo abusivo, pois pode ganhar feição de assédio moral.
Ensinar é transmitir ideias e muito mais do que isto. Mais nobre é instruir com vistas para os limites do que se afirma ao aprendiz. Preparar indivíduos para que sustentem o desejo de aprender como algo que não se esgota, auxiliar no manejo dos temores quanto ao que se desconhece, respeitar a ignorância e e aceitar, através de seu reconhecimento, a necessidade de renovar e ampliar o conhecimento, descartando o que perde o valor e buscando o melhor possível em cada momento. Nisso talvez resida um dos maiores desafios aos mestres. Há metas que (mesmo com algum nível de provisoriedade) são obrigatórias, inerentes à escolaridade e devem transcender as grades curriculares. As interrogações e pluralidade de interpretações devem ser acolhidas, pensadas, discutidas. A noção de responsabilidade nunca pode ser negligenciada, quanto ao que se ensina, o modo como isto é feito e especialmente quanto ao que se sugere ou se propõe para além da educação “técnica”.
Todos somos seres políticos. A política estará implícita em muitas de nossas ações. Ideologias permeiam os discursos, crenças rondam o que se comunica, mas não podem servir como moldes rígidos para a educação e menos ainda para a formação. O exercício da crítica ampla e livre deve ser o diapasão no que se transmite enquanto mestre e do que se recebe enquanto aluno. Não é moralmente aceitável ter por objetivo a formatação dos seres humanos, transforma-los em peças de engrenagens. As escolas nunca foram e nem serão espaços suficientes para a formação de quem as frequenta, mas são (ou devem ser) de grande importância. Talvez seja também papel da escola apontar para suas limitações e fomentar a educação continuada em sentido amplo, contribuir na preparação do solo em que o conhecimento vai brotar, crescer, ser reciclado e melhorado, como deve ser a vida.
Educação e formação devem ser empresas componentes dos esforços civilizatórios. No que se dá, recebe-se e conquista-se. Vias para legitimar singularidades e fomentar a consciência do que é e o que implica o pertencimento à coletividade, com sua infinita complexidade.
Abaixo: Afresco “Escola de Atenas” de Rafael Sanzio, Vaticano