PÓS-VERDADE E ILUSIONISMO

Pós-verdade é um termo que apareceu impresso pela primeira vez, segundo o Dicionário Oxford, num artigo do dramaturgo Steve Tesich e vem sendo usado com frequência tão crescente que foi incorporado ao léxico inglês. É uma expressão própria do século XXI.  Tem sido empregada especialmente em matérias que tratam de política. É algo que pode ser identificado em discursos de políticos e outros. Também pode aparecer na defesa de pontos de vista, nas justificativas ideológicas, pregações religiosas, etc. Com variações quanto à consciência do que se faz.
Seu sentido ganhou corpo, especialmente com relação a referências mais conotativas, mas foi se tornando denotativo para falar de circunstâncias em que a formação de uma opinião tem menos vínculo com a busca da informação fatual, objetiva do que com as crenças e passionalidades das pessoas ou grupos. A pós-verdade “materializa-se” através de compreensões subjetivas acerca de eventos ou ideias quando há substituição de evidências por convicções pré-moldadas, preconceitos, sentimentos, emoções, paixões, de sugestões enganosas, sem esquecer o uso de manipulação interpretativa da informação. A afirmação da pós-verdade passa a ocupar o lugar da (geralmente mais difícil) busca de verdade na tentativa de compreensão da realidade. Isso passa a servir como instrumento de convencimento e indução a certas ações, geralmente sob comando de alguma liderança.  Antes das ferramentas eletrônicas usadas para circulação de informação (como as redes sociais) as opiniões custavam mais para serem formadas. Hoje, esse é um processo muito rápido. O tempo disponível para conferência da veracidade de informações e reflexão sobre os significados delas também encolheu. O aprofundamento na busca de conhecimento parece ter perdido a importância. As ilusões se avolumam. Acabam por constituir artifícios para manipulação e controle das pessoas. Com frequência adotam-se ideologias e concepções de mundo sem que haja um exame cuidadoso e periódioco delas. Os indivíduos passam a enxergar a realidade através de lentes que a distorcem mais do que seria inevitável pelas subjetividades interpretativas.
Fanatismos e fundamentalismos refletem compreensões baseadas em pós-verdades ao invés do respeito à força dos fatos e do exercício do pensamento crítico. O distanciamento do funcionamento ético é patente. Responsabilidade e liberdade tornam-se termos vazios.
Abaixo: foto de obra de Julio Le Parc (Mendoza, Argentina, 1928)
le parc

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