A palavra identidade tem origem no termo latino idem, que designa coincidência, permanência, continuidade, igualdade. Talvez o conceito que ela abriga tenha tido sempre relevância para os seres humanos por implicar a afirmação de uma singularidade através da qual um indivíduo ou um grupo podem ser reconhecidos com alguma especificidade. De modo muito simplificado, a identidade é um tipo de definição que deriva do que acreditamos ser e do que os outros acreditam que somos. Não sabemos com precisão quando questões sobre a identidade começaram a ser formalizadas e estudadas. Provavelmente, conforme as sociedades foram tornando-se mais estruturadas e complexas a necessidade de delimitações entre pessoas e entre grupos foi adquirindo importância. Nos últimos séculos criaram-se diversas teorias sobre a epistemologia da identidade. E, como em quase tudo o que se tenta teorizar, não há consenso, permanência ou validade universal. Assim, na formação individual ou na constituição das culturas é relevante o estabelecimento, declaração e valorização de um conjunto de características interpretadas como elementos próprios e passíveis de funcionarem como definidores de identidades. Talvez parte da instrumentalização necessária nas lutas por poder. A despeito da globalização e da maior interação entre pessoas, alguma relativização do sentido das diferenças entre pessoas e maior miscigenação as afirmações de singularidades identitárias persistem. O valor da igualdade vem sendo tratado de maneiras díspares, em diferentes contextos. Por exemplo, algumas vezes a igualdade é invocada nas buscas por paz e justiça, em que prevalecem a ideia da fraternidade, solidariedade e equidade de direitos e deveres, já em outras, mais ou menos inversamente, são patentes as manifestações de rejeição e ações de exclusão ou destruição quanto àquilo que é interpretado como diferente e potencialmente ameaçador, mesmo sem que se possa saber em quê. O homem teme o diferente, o que desconhece ou escapa de suas crenças sobre o mundo. É pouco hábil no manejo da diversidade. Ainda é cabível dizer que as questões identificatórias transitam nos pântanos dos temores e aflições humanos. São parte da reação ao horror ante o desaparecimento, a morte. Todos nós, em algum momento, temos a necessidade de nos reconhecer e sermos reconhecidos por um conjunto de características. Inclui-se aí a esperança de burlar o apagamento que virá com o tempo. Mesmo que de modo pouco claro e racional, podemos crer na possibilidade de continuidade da nossa existência. Vale mencionar que parte de nossas dores reside na percepção da complexidade da identidade, de sua instabilidade, plasticidade e incompatibilidade com a exatidão que geralmente desejamos que tenha. É curioso notar que grande parte do que somos não é produto de escolhas conscientes e deliberadas que tenhamos feito. Somos o que somos para aquém e além do que pretendemos em nossos projetos e concepções sobre nós mesmos. É talvez desconcertante percebermos que isto não diminui nossa responsabilidade sobre nós e sobre nosso papel no mundo. Não somos bem o que queremos ser, não coincidimos com modelos que idealizamos, não vivemos em meios que possamos considerar suficientemente bons, mas cabe-nos buscar o melhor. Sem cessar. E assumir o ônus.
Tela do artista Ernani Pavaneli: Peixes II Acrílico sobre tela – 80cmx90cm
IDENTIDADE
