BADENHEIM 1939

A barbárie representada pelo Holocausto (ou Shoá ou Hurban, nomes em ídiche e hebraico) foi mais do que o assassinato de seis milhões de pessoas. Foi uma tentativa de aniquilação étnica/religiosa, mas ainda mais. E não somente por matar homossexuais, ciganos, opositores do regime nazista e outros indivíduos tomados como “defeituosos”. Mas, inclusive por exibir cruamente a facilidade assustadora com que o potencial para a violência e destrutividade de grande parte dos seres humanos (todos?) torna-se realidade concreta. Somam-se outros extermínios em massa, como os promovidos por Stálin na antiga URSS, que abarcaram povos da Ucrânia e outras repúblicas do “império”, além dos opositores do regime em qualquer lugar; pela Turquia entre 1915  e 1923, assassinando especialmente armênios; em Bangladesh em 1971, quando da separação entre Índia e Paquistão; no Camboja entre 1975 e 1979 pelo ditador Pol Pot; e outros ao longo da História.

A percepção disto pelos que não compartilham dos sentimentos e ideias usadas para justificar tais ações pode transformar-se numa forma de terror, sem os apanágios vulgares de estórias para brincar de assustar. Aharon Appelfeld (Czernovitz, Romênia quando nasceu e hoje Ucrânia, 1932 – Petah Tikva, Israel, 2018) foi um sobrevivente de um campo de concentração, do qual escapou ainda criança. Mais tarde imigrou para Israel, onde viveu até morrer e escreveu muitos livros, que traduzem a experiência emocional de quem caminhou pelas bordas do abismo. “Badenheim 1939” é sua obra mais famosa. Fala sobre o período em que judeus num balneário fabular foram retidos/aprisionados e aguardaram a deportação para um campo de extermínio na Polônia. Eles pressentiam a tragédia, mas não sabiam objetivamente em que consistiria. O que importa mais no pequeno romance é o “clima” que o autor consegue criar. Diferente de Kafka ou Levi, ele põe em cena a esperança difusa por um bom desfecho, que os personagens tentam valentemente sustentar. Enfrentar guerreiramente a situação seria um modo de suicídio.

Muitos vêm na ficção de Appelfeld a descrição de uma forma de negação do perigo iminente. Talvez seja um modo de olhar míope ou raso. Ele enxergou algo bem mais profundo do que isto. Teve coragem para ver e contar o que viu. Não em fatos, mas nas almas das pessoas. Há nisto a sofisticação da coragem intelectual e afetiva. Justamente uma função da esperança. Esperança que está na raiz da força de vida. O escritor mostra que a definição deste sentimento (ou mais do que isto) pode estar muito distante do que se propaga em frases corriqueiras ou verbetes de dicionário. É numa de suas dimensões mais comoventes que está seu foco nesta narrativa. Talvez onde resida a vertente mais fundamental na multifacetada qualidade de “humano”. Tocante, para quem puder ler.

Título da Obra: BADENHEIN 1939

Autor: AHARON APPELFELD

Tradutor: MOACIR AMÂNCIO

Editora: AMARILYS (MANOLE)

  

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3 comentários

  1. Nossa Lu adorei ler isso! Pois acabo aprendendo um pouco da história! Não dá pra acreditar que um dia isso se passou!

    Enviado do meu iPhone

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