A PRAIA

Sentir que se está efetivamente participando da vida não é algo banal. O movimento incessante dos elementos que compõem a realidade e sua complexidade desafiam as compreensões e ações, fazem bambolear as convicções dos que refletem e podem duvidar.

O conto “A Praia”, que faz parte do livro “Contos Exemplares” de Sophia de Mello Breyner Andresen (Portugal, 1919-2004) toca nos mistérios da afirmação da identidade e do papel que se desempenha no mundo. Não se trata de um único tema, mas de uma série deles, mais ou menos embricados. A autora fala sobre alguém, numa cidade costeira, que entra num clube onde há salão de baile, sala de jogos e bar. Pessoas conversam em grupos. Torna-se foco de observação do narrador da cena um homem só, magro, despido de sinais que permitam conjecturar sobre quem é ou o que faz. Já tarde, quando os frequentadores vão se retirando, ele consulta um relógio e faz lembrar o escoar do tempo, sugerindo sentimento de vergonha pelo que se perde ou que não se conquista. Ele junta-se a quem ainda está no bar do clube e na interação com os comensais faz com que sintam o espírito de vagueza, que é dele e de todos os outros.  

O leitor é informado que isto se passa no tempo da Segunda Guerra Mundial, na qual Portugal não lutou. Ouvem-se notícias entre os chiados de um rádio. O que é dito instiga a imaginação, mas parece não ter a consistência do que se dá numa vida real, parece um espetáculo a que se assiste, mas do qual não se participa efetivamente.

No final, amanhece sob denso nevoeiro e algumas pessoas põem-se a caminhar com destino à praia, de onde pressentem a imensidão do oceano, mas trafegam somente por suas bordas e sentem o cheiro de maresia.

O conto é liricamente metafórico e permite interpretações diversas. O que é dito deixa entrever uma posição ou uma maneira de conceber o viver, sempre sob a capa da sutileza.

Título da Obra: A PRAIA

Autora SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN

Editora: ASSÍRIO & ALVIM (Portugal)

Foto de pintura (óleo sobre tela) de Joaquín Sorolla (Valência, 1863 – Madrid, 1923); Museu Sorolla

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