DESPEDIDA EM VENEZA

Conjecturas sobre a morte convertem-se em tema de diversas áreas de expressão, desde as pinturas rupestres. Que esperanças povoam a imaginação humana quando considera a finitude? Que valor pode ganhar a vida na iminência de seu fim? Há certos bálsamos para alívio da angústia e dos temores. Talvez ressignificar a própria trajetória ou reafirmar o que se percebeu dela seja um deles. Encontrar algo em desvãos pelos quais se passou distraidamente. Até investir no futuro pode fazer sentido. Um porvir que não será desfrutado pelo morto, mas ainda assim um modo de existência. Há também a possibilidade de que uma pessoa sinta-se satisfeita com o que teve e tente enxergar o melhor no que se pode ter até o último momento. Louis Begley (Stryi, antes Polônia e agora Ucrânia, 1933; naturalizado estadunidense) explora isto em seu romance “Despedida em Veneza”. Autor que sempre demonstrou respeito pela capacidade humana de refinar o comportamento e de prover-se de olhos que possam ver a beleza, ele fala neste romance daquilo que não desaparece com a morte do indivíduo. Que estará fora dele (e de seu apagamento), mas algo que ele penetrou e que o penetrou. O sentido do poder conferido pelo dinheiro e pelos talentos pessoais é outra questão em exame. A elegância no comportamento e especialmente nos modos de compreender o mundo é para Begley um trunfo possível, pelo qual vale lutar até o fim. Há uma busca por dotar-se com a nobreza de não diminuir a importância do que se perde quando se morre. Vale dizer que ele não é nada frívolo. Preocupações de ordem estética não podem ser confundidas com superficialidade nos trabalhos deste escritor. Para ele, dar relevo demais às desgraças é uma forma intolerável de vulgaridade, de jogar fora a oportunidade de bendizer a vida, para bem dize-la. O protagonista do livro tem uma doença incurável e resta-lhe pouco tempo. Decide passar alguns dias em Veneza, sorvendo a beleza e a força do que se constrói para afirmar o que se viveu e o que se desejou viver. Valem obras arquitetônicas, pinturas de Ticiano, conversas com gente que encontra, a amizade e o amor. Este pode estar até emancipado do sexo (que acabou propiciando-lhe menos do que ele esperava, mas em que o que faltou não deteriora o que há).  No momento em que está o protagonista não há nada a fazer de grandioso. Nem revisões transfiguradoras de si mesmo e do que aconteceu-lhe por sua vontade ou para além dela. Sem navegar em mágoas e nem negligenciar o que não foi bom ele contempla seu percurso e vislumbra seu fim. Não apequena nada. Só vive sem perder de vista o belo. Em cada oportunidade. Em Veneza ou qualquer outro lugar.

Título da Obra: DESPEDIDA EM VENEZA

Autor: LOUIS BEGLEY

Tradutora: ANNA OLGA DE BARROS BARRETO

Editora: COMPANHIA DAS LETRAS

DESPEDIDA

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