LEITURA E LIBERDADE

Como as palavras são invariavelmente  polissêmicas, é bom definir aproximativamente a acepção do termo liberdade utilizada aqui. Primeiramente, é um substantivo (com justeza abstrato) muito mais útil para indicar uma aspiração, uma meta ou um ideal do que uma realidade concreta. A liberdade não pode ser capturada ou experimentada de modo absoluto. Vale também mencionar o fato de que nunca deixaremos de ser condicionados pela Natureza.  Somos criaturas biológicas talvez antes de sociais e, em grande parte, regidas por “imperativos” naturais. Adicionalmente, as forças que impulsionam nosso funcionamento psicológico também são pouco domáveis por nós mesmos, assim como não o é aquilo que provém dos outros, a despeito dos esforços em contrário que possamos fazer.  Então a Liberdade é sobretudo uma ideia. Só parcialmente transformável em experiência vivida. Todavia, é muito pregnante em nossos anseios e esperanças, naquilo que guia e conforma nosso comportamento. Preciosa. Algo a ser conquistado. A capacidade de leitura também é uma conquista. Iniciada com nossa alfabetização, alimenta e é alimentada na aquisição e expansão da competência para interpretar com riqueza de sentidos e possibilidades os textos (nas mais variadas formas) a que temos acesso. É também oportunidade de geração de ideias novas, da ampliação de nossos horizontes conceituais para além do aprendizado mecânico e da adesão às crenças grupais e automáticas. Pode nutrir e robustecer. Talvez crie subsídios para assumirmos  posições e tomarmos decisões na vida. De quebra, pode proporcionar um tipo de “magia” que reduz a dureza do cotidiano, frequentemente árido, conturbado, difícil e até paralisante. Propicia-nos “férias” criativas das turbulências do mundo. Viabiliza um tipo de colorização. Revigora. Viajamos em estórias e olhares de outros. A leitura sistemática e variada, que extrapole nossas necessidades acadêmicas e profissionais, contribui para a autonomia do nosso pensar, para a sofisticação da capacidade crítica, para o amadurecimento emocional e intelectual. É uma ferramenta da qual podemos lançar mão na conquista de graus crescentes de liberdade. Daquilo que é imprescindível na vastidão deste conceito. Pode ajudar-nos nos processos necessários da compreensão de nossos limites e limitações, na Natureza e diante de outros seres humanos. E também a reconhecer os pontos de comunhão. Um Bem possível.

Abaixo, obra do pintor brasileiro Almeida Júnior: “Leitura” de 1892, óleo sobre tela, 95X141 cm, Pinacoteca do Estado de São Paulo

 

9 comentários

  1. Adorei o seu texto! Ele sintetiza minha luta de uma vida inteira pelos livros, leitura, literatura e, portanto, esta liberdade de que vc falou. Parabéns .

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