O GENE: UMA HISTÓRIA ÍNTIMA

 

Desde a Antiguidade o homem busca respostas para questões sobre hereditariedade. Aristóteles e Pitágoras já mostravam interesse pela transmissão de características físicas e comportamentais por sucessivas gerações. Todavia, foram necessários aproximadamente dois mil anos para que surgissem os primeiros conceitos sobre o tema que fossem articulados mirando evidências científicas. Produto de uma verdadeira saga do conhecimento científico. 
Siddhartha Mukherjee conta a história de parte importante destes eventos no ótimo “O Gene: uma história íntima”. Autor já premiado com o Pulitzer de jornalismo por um livro de divulgação científica sobre o câncer, o indiano Mukherjee, biólogo, médico oncologista e professor da Universidade de Colúmbia mostra-se digno de mais um prêmio com este trabalho bem escrito e recheado de informações interessantes. O autor traça um vasto painel com início nas crenças sobre a existência de um homúnculo no sêmen, que percorreria o corpo recolhendo características paternas e que ao ser implantado no útero seria nutrido para desenvolver-se até o nascimento; passa pelas descobertas de Mendel, que no século XIX introduziu a ideia de gene antes mesmo dele ser fisicamente conhecido; fala de Morgan e Muller, que afirmaram a natureza dos genes como estruturas biológicas; de Avery, que propôs o conceito de gene como forma química; de Tatum e Beadle, que nos anos 1930 descobriram (parcialmente) como os genes atuavam; de Watson, Crick, Wilkins e Franklin, que chegaram à estrutura química do DNA (que constituem os genes); e assim vai descrevendo o trabalho de muitos pesquisadores maravilhosos até chegar à engenharia genômica e às polêmicas terapias gênicas.  E mais, não se detém em relatos de história da ciência, discute as complicadas questões éticas envolvidas tanto na pesquisa desta área quanto nos projetos de utilização prática do conhecimento adquirido e tecnologias desenvolvidas. De leitura bastante agradável, o livro informa e faz com que o leitor se envolva em reflexões sobre o bem e o mal praticável a partir de um saber, potencialmente tão poderoso. Entre tudo o que é incerto no campo da geração de conhecimento, que se move e transforma, é marcante nesta obra a noção de que a Natureza é extremamente forte, determinante e que não se converte fácil e diretamente em Cultura, mesmo considerando que esta última possa contribuir para aspectos de sua evolução. O autor mostra como no decorrer da segunda metade do século XX e início do XXl ficou quase impossível atribuir exclusivamente às vivências psicológicas e sócio culturais explicações sobre o comportamento humano como fizeram muitos cientistas sociais antes do enorme avanço recente das ciências biológicas. O trabalho de Mukherjee é precioso, especialmente porque a maioria de nós ainda não tem noção clara do que hoje se sabe através das pesquisas científicas, assim como do que não se pode mais sustentar como conhecimento válido. Fica também marcado o valor do respeito pelo que ignoramos, como uma forma de humildade inteligente, que acaba se convertendo em valorização do conhecimento e dos cuidados com os métodos para tece-lo.

 

Título da Obra: O GENE: UMA HISTÓRIA ÍNTIMA
Ano de Publicação Original: 2016

Autor: SIDDHARTHA MUKHERJEE

Tradução: LAURA TEIXEIRA MOTTA

Editora: COMPANHIA DAS LETRAS

 

3 comentários

Deixe um comentário